7 de agosto de 2010

O cheiro do medo



Todos sabem que ratos têm medo de gatos. Quem nunca assistiu a um dos episódios de Tom & Jerry? Ao dar de cara com o Tom, o Jerry sempre dava no pé, pois ele sabia que aquele era o seu predador. Ele era a caça e o Tom, o caçador. Mas você sabia que mesmo ratos nascidos em laboratório, que nunca chegaram perto de um gato na vida, reagem com medo ao sentir o cheiro de um gato? Esta é uma reação inata, a presa já nasce com ela, o que lhe dá uma grande vantagem para fugir do seu predador. Talvez por isso o Tom nunca tenha conseguido pegar o Jerry!
Até pouco tempo atrás, não se sabia exatamente como isso acontecia. Seria realmente o cheiro do predador que gerava a reação de medo? Como as presas detectam este cheiro e o interpretam como perigo? Como a presa é capaz de detectar e identificar o cheiro de diferentes predadores?
Cientistas do Instituto de Pesquisa Scripps (EUA) e da UNICAMP (SP, Brasil) realizaram experimentos com camundongos para tentar responder a estas perguntas.
Primeiro, eles viram que o olfato é realmente importante para causar a reação de medo. Um órgão chamado vomeronasal, presente no nariz destes roedores, possui neurônios sensoriais responsáveis pelo olfato. Os camundongos que tinham um defeito neste órgão não reagiam com medo ao odor de predadores. Já os camundongos com um órgão vomeronasal perfeito, reagiam com medo e com um comportamento defensivo. Além disso, as regiões do seu cérebro responsáveis pelo olfato eram fortemente ativadas. A partir destas observações, os cientistas puderam concluir que o órgão vomeronasal é importante para o reconhecimento olfativo de predadores.
Em seguida, eles descobriram que a reações de medo e defesa são acionadas por proteínas específicas chamadas Mup, presentes na urina, na saliva, nos pêlos e na pele de muitos predadores, mas também na urina dos próprios camundongos. Os pesquisadores viram que as proteínas Mup de outros animais ativam neurônios diferentes no órgão vomeronasal e levantaram a hipótese de que existam neurônios especializados em reconhecer proteínas Mup de diferentes origens.
Através da ativação de neurônios específicos, seriam geradas respostas comportamentais distintas para cada tipo de estímulo. Por exemplo, a proteína Mup presente na urina de camundongos induz agressividade em outros camundongos machos – uma forma de marcarem seu território. No entanto, as proteínas Mup de predadores naturais como gatos, ratos e cobras, induzem o comportamento defensivo e de medo nos camundongos.
Todas estas observações confirmam que o comportamento observado em camundongos diante de predadores é inato. O sistema nervoso destes animais é geneticamente programado para detectar predadores e para reagir com um comportamento defensivo, ainda que nunca tenham se deparado com um predador na vida.
No final das contas, mesmo antes do primeiro encontro, o Jerry sempre esteve um passo a frente do Tom!
                                                           
Referência:
Papes, F.; Logan, D.W. & Stowers, L. 2010. The Vomeronasal Organ Mediates Interspecies Defensive Behaviors through Detection of Protein Pheromone Homologs. Cell: 141, 692–703, May 14, 2010. DOI 10.1016/j.cell.2010.03.037

Neste link, além do artigo e um resumo gráfico do trabalho, tem um vídeo onde os pesquisadores explicam o seu trabalho (em inglês).

Há tempos...


Já faz um bom tempo que não escrevo aqui no blog. Idéias não faltam, falta apenas passá-las para o papel :-) Neste meio tempo, junto com a Lia, comecei a idealizar um blog de divulgação científica, mas por "motivos de força maior", este projeto está temporariamente parado. Como eu já tenho um texto pronto - escrito para este novo blog - vou publicá-lo aqui antes que a notícia fique velha!

Aproveito para pedir a opinião crítica daqueles que lerem o texto cujo público alvo são adolescentes e jovens adultos não biólogos.