24 de setembro de 2010

XI ECOTOX: Nanopartículas, proteínas e ecotoxicologia.




Quem me conhece ou lê o blog sabe que apesar da minha área ser a ecotoxicogenômica, eu vou bem mais para a “genômica” do que para a “ecotoxicologia”, pois meu trabalho atual e minha formação na graduação tem este viéis. Apesar disso, ou justamente por isso, eu tento ficar antenada também na ecotoxicologia e,  por isso, optei por apresentar meu trabalho no XI ECOTOX que, este ano, foi em Bombinhas, SC. O lugar é um paraíso na terra, apesar do clima estar frio, chuvoso e de parecer que a cidade inteira (incluindo comércio) ter saído de férias. Brincadeiras a parte, a cidade tem praias lindas, uma boa infra-estrutura hoteleira e certamente merece uma visita (no verão!).
Como minha intenção não é resumir aqui cada palestra que eu assisti, destaco as minhas impressões sobre os assuntos que mais chamaram minha atenção: a palestra e a mesa redonda sobre nanoresíduos e a palestra sobre proteômica aplicada a ecotoxicologia (é claro!).
A toxicologia de nanoresíduos é uma necessidade diante do crescente uso destes materiais (sim, já são muitos os produtos com nanotecnologia no mercado). A nanotecnologia vem se desenvolvendo bem mais rapidamente que os estudos acerca dos seus riscos para a saúde humana e para o meio ambiente. Como a demanda de informação é grande, imaginava que a toxicologia de nanopartículas fosse a “bola da vez” na área. No entanto, parece que globalmente estes não estão entre os projetos mais financiados. Talvez, porque milhões (ou bilhões?) tenham sido (e ainda são) investidos no desenvolvimento de nanotecnologias e tais estudos seriam um balde de água fria na área. Em todo o mundo, não há um único país que já tenha alguma regulamentação sobre o uso de nanopartículas e sem a realização de estudos toxicológicos não teremos as informações necessárias para regulamentar o seu uso. Mais uma vez, parece que vamos esperar os danos serem feitos, para depois fazer alguma coisa. Ainda assim, pelas palestras que assisti, pude ver que ainda que sejam poucos, os trabalhos na área são de qualidade e mostram resultados muito relevantes.
A palestra sobre proteômica aplicada na ecotoxicologia foi muito bacana, mostrou bem as perspectivas da área aprofundando-se na parte mais técnica na medida certa para o evento. Além da clássica comparação do perfil protéico (géis 2D) entre animais expostos e controle, foram apresentadas outras possibilidades, como subproteomas (de compartimentos subcelulares, secretomas, peptidomas, etc), detecção de proteínas com aductos específicos induzidos por xenobióticos e, o que mais me chamou a atenção, o ABPP (activity based protein profiling). Esta técnica permite detectar a atividade enzimática de diferentes enzimas simultaneamente através da utilização de substratos marcados. A atividade enzimática indica que de fato houve uma alteração no metabolismo celular e esta informação tem, portanto, maior relevância biológica que a detecção da indução de mRNA e da proteína, que não necessariamente se refletiriam em um aumento de atividade enzimática. Imaginem poder avaliar a atividade de todos os CYPs ou GSTs de um organismo simultaneamente? Uma técnica promissora!
Embora, já existam trabalhos com biomarcadores moleculares, espero ver no futuro trabalhos que lancem mão das “ômicas” na ecotoxicologia também aqui no Brasil e, certamente, esta palestra foi um bom incentivo. Também senti falta de palestras sobre outros poluentes emergentes além das nanopartículas, como compostos farmacêuticos presentes em efluentes domésticos. Fica a dica para a próxima!

ISMEE - Últimas vagas!


A Primeira Escola Internacional de Ecologia Marinha e Ecotoxicologia - que eu já divulguei por aqui - será no mês que vem! Mas se você perdeu o prazo de inscrição da primeira seleção, ainda dá tempo de se inscrever e conseguir uma das vagas extras que estão sendo oferecidas!

Para se inscrever, preencha o formulário no site do evento. Não se esqueça de anexar seu currículo e informar seu e-mail de contato.Lembrando que podem se inscrever alunos de pós-graduação de mestrado e doutorado.

Dúvidas devem ser encaminhadas para o e-mail do evento: ismee@bioletim.org

7 de agosto de 2010

O cheiro do medo



Todos sabem que ratos têm medo de gatos. Quem nunca assistiu a um dos episódios de Tom & Jerry? Ao dar de cara com o Tom, o Jerry sempre dava no pé, pois ele sabia que aquele era o seu predador. Ele era a caça e o Tom, o caçador. Mas você sabia que mesmo ratos nascidos em laboratório, que nunca chegaram perto de um gato na vida, reagem com medo ao sentir o cheiro de um gato? Esta é uma reação inata, a presa já nasce com ela, o que lhe dá uma grande vantagem para fugir do seu predador. Talvez por isso o Tom nunca tenha conseguido pegar o Jerry!
Até pouco tempo atrás, não se sabia exatamente como isso acontecia. Seria realmente o cheiro do predador que gerava a reação de medo? Como as presas detectam este cheiro e o interpretam como perigo? Como a presa é capaz de detectar e identificar o cheiro de diferentes predadores?
Cientistas do Instituto de Pesquisa Scripps (EUA) e da UNICAMP (SP, Brasil) realizaram experimentos com camundongos para tentar responder a estas perguntas.
Primeiro, eles viram que o olfato é realmente importante para causar a reação de medo. Um órgão chamado vomeronasal, presente no nariz destes roedores, possui neurônios sensoriais responsáveis pelo olfato. Os camundongos que tinham um defeito neste órgão não reagiam com medo ao odor de predadores. Já os camundongos com um órgão vomeronasal perfeito, reagiam com medo e com um comportamento defensivo. Além disso, as regiões do seu cérebro responsáveis pelo olfato eram fortemente ativadas. A partir destas observações, os cientistas puderam concluir que o órgão vomeronasal é importante para o reconhecimento olfativo de predadores.
Em seguida, eles descobriram que a reações de medo e defesa são acionadas por proteínas específicas chamadas Mup, presentes na urina, na saliva, nos pêlos e na pele de muitos predadores, mas também na urina dos próprios camundongos. Os pesquisadores viram que as proteínas Mup de outros animais ativam neurônios diferentes no órgão vomeronasal e levantaram a hipótese de que existam neurônios especializados em reconhecer proteínas Mup de diferentes origens.
Através da ativação de neurônios específicos, seriam geradas respostas comportamentais distintas para cada tipo de estímulo. Por exemplo, a proteína Mup presente na urina de camundongos induz agressividade em outros camundongos machos – uma forma de marcarem seu território. No entanto, as proteínas Mup de predadores naturais como gatos, ratos e cobras, induzem o comportamento defensivo e de medo nos camundongos.
Todas estas observações confirmam que o comportamento observado em camundongos diante de predadores é inato. O sistema nervoso destes animais é geneticamente programado para detectar predadores e para reagir com um comportamento defensivo, ainda que nunca tenham se deparado com um predador na vida.
No final das contas, mesmo antes do primeiro encontro, o Jerry sempre esteve um passo a frente do Tom!
                                                           
Referência:
Papes, F.; Logan, D.W. & Stowers, L. 2010. The Vomeronasal Organ Mediates Interspecies Defensive Behaviors through Detection of Protein Pheromone Homologs. Cell: 141, 692–703, May 14, 2010. DOI 10.1016/j.cell.2010.03.037

Neste link, além do artigo e um resumo gráfico do trabalho, tem um vídeo onde os pesquisadores explicam o seu trabalho (em inglês).

Há tempos...


Já faz um bom tempo que não escrevo aqui no blog. Idéias não faltam, falta apenas passá-las para o papel :-) Neste meio tempo, junto com a Lia, comecei a idealizar um blog de divulgação científica, mas por "motivos de força maior", este projeto está temporariamente parado. Como eu já tenho um texto pronto - escrito para este novo blog - vou publicá-lo aqui antes que a notícia fique velha!

Aproveito para pedir a opinião crítica daqueles que lerem o texto cujo público alvo são adolescentes e jovens adultos não biólogos.



31 de julho de 2010

1st PRIMO International School on Marine Ecology and Ecotoxicology - ISMEE

De 17 a 31 de outubro de 2010 acontecerá em Arraial do Cabo, Rio de Janeiro,  a Primeira Escola Internacional de Ecologia Marinha e Ecotoxicologia. O público alvo são alunos de pós-graduação, preferencialmente doutorandos em seu primeiro ano de curso. 

Estão previstas atividades relacionadas a ecologia, biologia marinha, metodologia científica, história da ciência, desenho experimental, análise de dados entre outras.

A escola é uma iniciativa do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho (UFRJ) e da Conferência PRIMO (Pollutant Responses in Marine Organisms).

Veja mais informações e como se inscrever no site do evento:


Participem e divulguem!!!

28 de abril de 2010

O todo é mais que a soma das partes.



Impressões sobre o Systems Biology Meeting – Ouro Preto – MG – 2010.

 A ciência sempre estudou as partes como meio de entender o todo. Mas nem sempre as partes se encaixam ou podem ser corretamente interpretadas quando isoladas. Quando olhamos para o todo, temos a perspectiva correta para colocar todas as peças no lugar e entender todas as conexões da complexa e dinâmica rede de moléculas que regem uma célula."

                                   (RNAse Free, “Eu vejo um novo começo de Era”, 29/01/2010)

A biologia de sistemas se sustenta sobre esta premissa. Seu objetivo: entender como uma célula ou um organismo funciona como um todo. Um organismo é um sistema complexo formado por componentes de diferentes propriedades e pelas conexões entre eles. 
Avanços tecnológicos recentes têm permitido que tenhamos uma visão mais global dos processos biológicos através de técnicas que produzem grandes quantidade e diversidade de dados.

O sistema e seus componentes.

Grande parte dos projetos ainda está concentrada na identificação dos componentes que constituem os sistemas biológicos: genoma, transcriptoma, proteoma, metaboloma, lipidoma, etc. Mesmo assim, ainda faltam muitas “peças” para sermos capazes de montar a “máquina” da vida.
Se não conhecemos todas as suas peças, não podemos entender como esta máquina funciona e nem criar modelos universais que a descrevam. E quanto mais genomas, transcriptomas e proteomas são seqüenciados, mais encontramos genes e proteínas desconhecidas, RNAs não codificantes – pequenos ou longos – de funções ainda desconhecidas. Peças que ainda não sabemos onde se encaixam e nem o que fazem.

As conexões do sistema.

Para montar esta máquina, além de conhecer suas partes, temos que entender como elas se relacionam, como se conectam. Conhecer as conexões entre os componentes de um sistema é essencial para entendermos como ele funciona.  E, pelo que vi neste encontro, este é atualmente um dos maiores desafios. Para superá-lo é imprescindível o desenvolvimento de ferramentas computacionais para manejar, interpretar e integrar a enorme quantidade de dados gerados por técnicas cada vez mais “high throughput”.
Mas muitos avanços já foram feitos. Ferramentas estão sendo desenvolvidas para integrar estes dados, gerar modelos matemáticos e montar redes de interação.
Como eu já falei aqui, a complexidade dos organismos está intrinsicamente relacionada a sua capacidade de regular seus componentes. E grande parte das “novas peças” -  RNAs não codificantes e sequências genômicas antes consideradas DNA “lixo” – estão aparentemente envolvidas em mecanismos de regulação gênica. Entender estes mecanismos de regulação é um passo importante para saber como todas as peças se encaixam para formar um sistema funcional.

O sistema a nosso favor: biologia sintética.

A biologia de sistemas busca integrar diferentes tipos de dados, achar a conexão entre eles para, por fim, criar modelos que permitam prever fenômenos biológicos, dados os componentes envolvidos. Embora isso ainda não seja exatamente uma realidade, esta história já tem um belo começo e começa a gerar frutos. Aplicações biotecnológicas para todo este conhecimento já começam a surgir.
Conhecendo as peças de uma máquina, como se encaixam e como juntas funcionam, podemos modificá-la ou, seguindo os seus princípios, criar uma máquina nova. E é isso que a biologia sintética se propõe a fazer: criar sistemas biológicos modificados para, por exemplo, produzir biocompostos, com maior eficiência. Fazer com que a máquina trabalhe a nosso favor.

O sistema é multidisciplinar

Ao final de cada palestra, havia sempre uma longa lista de pessoas envolvidas no projeto: professores, pós docs, doutorandos, mestrandos, alunos de graduação e colaboradores externos. A biologia de sistemas é a integração de várias disciplinas e seus projetos só podem ser executados através da colaboração entre profissionais com diferentes especialidades e mesmo entre instituições com infra-estruturas complementares, uma vez que muitos dos equipamentos necessários não são banais, mesmo para instituições acima da linha do equador.
Alguns palestrantes mostraram, inclusive, um fluxograma de etapas e pessoas, mostrando como todos estão conectados e como um depende dos dados do outro para realizar o seu trabalho.
Há quem veja a especialização do conhecimento com maus olhos, mas convenhamos que não há outro jeito. Estes projetos envolvem biologia molecular, celular, bioquímica, matemática, estatística e ciências computacionais em níveis avançados. Dificilmente, um único ser humano seria excepcional em todas estas áreas. Mas embora cada um faça sua parte, é importante que todos tenham um conhecimento mínimo de todas as etapas envolvidas e do projeto como um todo e, assim, não percam a perspectiva.
Achei muito legal ver trabalhos serem feitos totalmente em colaboração. Todos em um grupo de pesquisa, trabalhando dentro de um mesmo tema, por um mesmo projeto, para responder perguntas diferentes, mas dentro de uma questão maior. Até onde eu sei, isso não é tão comum aqui no Brasil. Geralmente, é cada aluno com o seu projeto. Por mais que estes projetos tenham alguma relação ou estejam dentro de um mesmo tema, não são tão interconectados e colaborativos assim. Penso em como poderíamos produzir trabalhos mais completos, se pensássemos e trabalhássemos mais em equipe!

24 de abril de 2010

Systems Biology Meeting - Ouro Preto, MG.



Entre 25 e 29 de abril estarei no Brasil Deutschland Systems Biology meeting, em Ouro Preto (MG).

A biologia de sistemas busca integrar dados heterogênos - derivados das muitas ômicas existentes hoje em dia - e, assim, construir uma visão sistêmica dos processos biológicos.

A programação está bastante interessante e conta com palestras sobre diferentes  bancos de dados e plataformas de biologia de sistemas, além de palestras sobre redes gênicas, microRNAs, biologia de sistemas do RNA e sobre o sequenciamento do transcriptoma de tumores através de uma abordagem ainda bastante recente chamada RNA-seq.

Na medida do possível, postarei atualizações sobre o evento durante a semana!

19 de março de 2010

Aniversário: dois anos no ar!


Hoje, o RNAse Free completa dois aninhos no ar! E por uma coincidência bem legal é também a minha defesa de mestrado. Por esta razão, vou ficar devendo um post-científico-comemorativo. Mas é por boas razões :-)

Nos últimos 2 anos, compartilhei aqui muitas das coisas que aprendi, mas o blog também me serviu de incentivo para estudar e aprender coisas novas O que a princípio não me pareceu ser uma boa idéia, acabou me conquistando e, hoje, adoro postar!

Por mais que eu tente escrever também sobre coisas não relacionadas ao meu trabalho, eu não consigo fugir muito da biologia molecular e da genética. Não tem jeito: adoro! Depois destes 2 anos, me convenci que o blog é um espaço legal também para discutir algo tão específico. Por mais que não bata recordes de acesso, o blog é diariamente acessado  (média de 20/dia) e volta e meia faço novos contatos e troco idéias com outras pessoas da área.


Por isso, agora o RNAse Free está oficialmente vestindo a camisa da biologia molecular e genética (com pitadas de bioinformática para modernizar a coisa), agora que tenho pelo menos mais 4 longos anos nesta vida de bancada para encher o blog com posts sobre estes assuntos.

Mas além disso, eu quero este ano, FINALMENTE, tirar do papel a idéia de fazer um segundo blog, voltado para divulgação científica. Primeiro, porque eu gostaria de contribuir  com a divulgação da ciência produzida, principalmente, nas universidades brasileiras. Mas também porque, para escrever e manter um blog como este, eu vou ter que trabalhar muito a minha escrita e a minha capacidade de explicar as coisas de uma forma compreensível para pessoas-não-biólogas-moleculares (quase o mundo inteiro). E estas são habilidades que eu preciso melhorar! Vamos ver se desta vez sai! :-)

29 de janeiro de 2010

"Eu vejo um novo começo de era"




2010. Estamos fechando a primeira década do milênio. E para a biologia molecular, este começo foi muito bom: cada vez mais aumenta o número de variáveis avaliadas por experimento. Genomas e mais genomas inteiros são seqüenciados, experimentos com milhares de genes e proteínas são feitos. Ao invés de olhar para cada gene separadamente, agora, podemos ver como todos os genes de um organismo se comportam ao mesmo tempo. Estamos na era das ômicas.

A ciência sempre estudou as partes como meio de entender o todo. Mas nem sempre as partes se encaixam ou podem ser corretamente interpretadas quando isoladas. Quando olhamos para o todo, temos a perspectiva correta para colocar todas as peças no lugar e entender todas as conexões da complexa e dinâmica rede de moléculas que regem uma célula.

Mas para olhar para o todo e, de fato, enxergar tudo, ainda é preciso desenvolver meios melhores de manejar e, principalmente, integrar dados heterogêneos derivados do genoma, do transcriptoma, do proteoma, do metaboloma...

Parece um quebra-cabeça infinito!

Enquanto ainda estamos aprendendo a lidar com tanta informação, estão surgindo novas técnicas de sequenciamento de DNA que prometem impulsionar ainda mais este salto, das partes para o todo. Por 30 anos, o método de sequenciamento de DNA de Sanger é usado por toda a comunidade científica. Desde a sua publicação, em 1977, este método foi otimizado e automatizado ao ponto de permitir o sequenciamento de todo o genoma humano, concluído em 2003.

No entanto, em relação ao custo e principalmente a velocidade de produção de sequências, a “próxima geração de sequenciamento” deixa o método Sanger no chinelo. Para se ter uma idéia, em uma única corrida em um destes novos equipamentos, é possível produzir uma quantidade de sequências para a qual seriam necessárias 50 corridas em um equipamento pelo método de Sanger. Um pequeno genoma bacteriano poderia ser seqüenciado em uma única corrida. É um salto tecnológico sem precedentes!

É claro que nem tudo são flores, a maioria destas tecnologias produz sequências tão curtas quanto 20pb, mas outras já chegam a 400pb e, possivelmente, este número ainda deve aumentar. O maior desafio tem sido gerar ferramentas de bionformática para lidar com estes dados, mas esta corrida também já foi lançada.

Estas técnicas já estão sendo aplicadas a diferentes questões, em estudos metagenômicos, no sequenciamento de genomas e transcritptomas, como meio de inferir os níveis de expressão gênica em organismos sem qualquer sequência conhecida e mesmo para estudar o acúmulo de mutações em escala genômica ao longo das gerações de uma linhagem bacteriana. Novamente: é um salto tecnológico sem precedentes!

Para quem se interessar, recomendo a leitura destes dois artigos:


Stephan C Schuster. Next-generation sequencing transforms today's biology. Nature methods 5: 16-18 (2008). 

21 de janeiro de 2010

PCR: uma boa idéia!


A PCR (reação em cadeia da polimerase) sem dúvida foi uma invenção que revolucionou a biologia molecular ao permitir a síntese de DNA in vitro. Através desta técnica, é possível produzir bilhões de cópias de um segmento de DNA específico, a partir de uma única molécula! Pelo menos, em um mundo perfeito. Mais de duas décadas depois da sua invenção, já são muitas as variações e aplicações da PCR como no diagnóstico de doenças, na contagem de carga viral, na detecção de patógenos, em exames forenses e  como ferramenta em uma quase infinita lista de abordagens de pesquisa.

Kary B. Mullis foi o cara que inventou o PCR e por isso ganhou o prêmio nobel de química de 1993. Na época, ele trabalhava em uma empresa a quem vendeu sua idéia pela quantia irrisória de 10 mil dólares. A empresa vendeu a patente por 300 bilhões de dólares! Ou seja, Kary se deu mal, mas ganhou seu 1 milhão de dólares do prêmio Nobel e, hoje, ainda ganha muito dinheiro vendendo livros e dando palestras por aí.

Na verdade, há quem diga que Mullis somente incrementou o processo já descrito por H. Gobind Khorana e Kjell Kleppe, 17 anos antes, quando  conseguiram duplicar e, em seguida, quadruplicar uma pequena molécula de DNA sintético usando um par de primers e uma DNA polimerase. De qualquer forma, foi um "incremento" que fez toda diferença: usar a ciclagem de temperaturas e uma DNA polimerase resistente ao calor, uma vez que a cada ciclo é preciso aquecer o DNA a 94ºC para separar a dupla fita, o que tornava necessário adicionar mais DNA polimerase a cada ciclo.

Eis uma citação de Millis sobre como ele teve a idéia da PCR:

Sometimes a good idea comes to you when you are not looking for it. Through an improbable combination of coincidences, naiveté and lucky mistakes, such a revelation came to me one Friday night in April, 1983, as I gripped the steering wheel of my car and snaked along a moonlit mountain road into northern California’s redwood country. That was how I stumbled across a process that could make unlimited numbers of copies of genes, a process now known as the polymerase chain reaction (PCR).”

Kary B. Mullis, Scientific American (1990) 262:36.

Eu não acredito em sorte, mas em mentes preparadas para enxergar uma nova idéia...alguns podem chamar de inspiração, mas acho que é um conjunto de fatores, não apenas conhecimento e inteligência, mas maturidade, desprendimento e persistência. É ter em mãos um punhado de coisas aparentemente inúteis e enxergar algo grande que se pode fazer com elas. E depois todos dizem, “como eu não tive esta idéia antes?”. As melhores idéias, quando expostas parecem muito simples, tão simples que ninguém nunca pensou antes! Para mim, a sofisticação está na simplicidade. Em diversos contextos. E por mais estranho que pareça, nem sempre é fácil encontrar a solução mais simples. Mas pode parecer mais inspirador ouvir que estas idéias surgem assim, como uma lâmpada que acende de repente por pura "sorte", como a "revelação" descrita por Mullis.

Anyway, obrigada Mullis! O que seria de nós sem o PCR....