16 de abril de 2009

Clonagem II

Bom, depois de duas semanas, volto ao assunto delicado! O protocolo mais tradicional para clonagem molecular consiste em ligar os dois fragmentos de DNA utilizando a enzima T4 DNA Ligase que catalisa ligações fosfofodiéster, ou seja, catalisa a ligação covalente entre dois fragmentos de DNA. Mais recentemente, começou-se a usar um sistema de clonagem por recombinação (mediado por uma enzima recombinase), mas este sistema não é ainda amplamente utilizado talvez pelo preço ser ainda meio salgado além de estar disponível apenas por duas empresas. Eu tive uma má experiência com um destes kits no passado, mas como eu acho elegante (principalmente, o kit que eu nunca usei), vou falar um pouco sobre ele num próximo post.

Antes da clonagem, em paralelo, deve-se preparar os insertos (o que se deseja clonar: DNA genômico, cDNA, um gene específico, etc) e o vetor que pode ser de diferentes tipos, mas aqui falarei sobre vetores plasmidiais, que são os únicos com os quais já trabalhei. Muito resumidamente, isso consiste em digerir o plasmídio e o inserto com as mesmas enzimas de restrição a fim de obter terminações complementares para então ligá-las por meio da T4 DNA Ligase. A clonagem pode ser direcional ou não. Clonagem direcional significa que o fragmento de DNA será inserido no plasmídio em apenas um sentido. Para isso, o inserto pode ser digerido com duas enzimas diferentes: por exemplo, EcoRI cortando na extremidade 5’ e HindIII, na extremidade 3’. Digerindo o plasmídio com as mesmas enzimas, haverá apenas uma orientação possível para a ligação do inserto, aquela onde as extremidades são complementares. Discutirei aqui alguns pontos que considero mais problemáticos em toda a seqüência experimental relacionada a clonagem molecular.

Digestão por enzima de restrição

Se a digestão não for eficiente, a clonagem também não o será. Se os insertos não estiverem corretamente digeridos, não serão ligados ao vetor. Outro possível problema pode surgir quando se adiciona muita enzima ou se incuba a reação por muito tempo. Nestes casos, a enzima de restrição pode apresentar atividade “star” que consiste em clivar seqüências não específicas. Para a maioria das enzimas, após 2 horas, mais de 90% da atividade enzimática foi perdida, então, não vale a pena fazer digestões muito longas ou overnight.

A escolha das enzimas de restrição também é importante, mas depende do que se está fazendo. No meu caso, estou clonando uma mistura de diferentes cDNAs nos quais foram adicionados adaptadores de seqüência conhecida (contendo sítios de restrição escolhidos) em ambas as extremidades. Neste caso, deve-se usar uma enzima que reconheça um sítio bem incomum, para evitar cortar as seqüências de cDNA que se deseja clonar e digerir apenas os sítios presentes nos adaptadores. Existe um site onde se pode checar a freqüência de alguns sítios de restrição nos genomas de várias espécies, mas infelizmente, não estou achando o link (se achar, posto aqui). Se objetivo é construir uma biblioteca genômica, deve-se escolher a enzima também com base na freqüência de ocorrência do seu sítio no genoma, para que então se obtenha fragmentos da faixa de tamanho desejada para clonagem. Se a seqüência do inserto é conhecida, como no caso de uma subclonagem, pode-se checar que enzimas o cortam no webcutter.

Preparo do vetor

Em particular, a digestão do vetor plasmidial é extremamente importante. Se a digestão não for completa, moléculas de DNA plasmidial circulares permanecerão e causarão muita dor de cabeça: muitos PCRs e “minipreps” inúteis. Estas moléculas não gerarão clones recombinantes durante a reação de ligação, pois estão fechadas (circulares) e na próxima etapa, quando se usa os produtos da ligação para transformar células bacterianas, estas moléculas de plasmidio “vazios” (sem um inserto dentro) irão gerar muitas colônias! Existem formas de se diferenciar as colônias que contém inserto das que não contém, pois algum “background” (plasmidios não digeridos) sempre haverá. O sistema mais comum é a seleção azul/branco (“blue/White screening”). Que é bastante usado e que não vou explicar aqui para não me prolongar ainda mais (quem quiser saber mais, clique no link).

Um procedimento muito comum é tratar o plasmidío após digerido com uma fosfatase para remover o fosfato 5’ e assim impedir que o plasmídio “recircularize”. Em paralelo, deve-se fosforilar o inserto. Para reduzir ainda mais o background, também é interessante, fracionar o plasmídio digerido por eletroforese em gel de agarose e, então, excisar e purificar a banda referente ao plasmídio digerido, uma vez que o mesmo não digerido corre no gel em um padrão diferente como se tivesse um tamanho maior.

E por fim, pode-se avaliar o background do vetor antes de realizar a ligação. Isto pode ser feito, fazendo uma transformação com uma pequena alíquota do vetor pronto para clonagem: quanto menos colônias, melhor! E é claro, ao fazer a ligação, fazer também um controle negativo sem inserto para avaliar o quanto dos plasmídios “recircularizaram” durante a reação.

Eficiência da Ligação

Vários fatores podem influenciar a eficiência da T4 DNA Ligase. Primeiramente, como em toda reação enzimática, é importante que os fragmentos de DNA estejam bem purificados, livres de contaminantes protéicos, fenólicos, sais, enfim, só DNA e água! Em segundo lugar, a T4 DNA ligase é dependente de ATP. Em algumas enzimas, o ATP já está presente no tampão. Em outras, se adiciona separadamente. No entanto, ATP não é muito estável e se o tampão já é um pouco velho, pode ser uma boa suplementar a reação com um pouco de uma solução nova de ATP. A temperatura ótima da T4 DNA Ligase é de 25ºC, no entanto, a temperatura a ser usada deve ser um meio termo entre a melhor temperatura para a enzima e para o anelamento das seqüências (overhangs ou bluntends) do plasmidio com o inserto.

E....o mais importante: a razão molar inserto:vetor! Para garantir que os insertos sejam ligados aos plasmídios e reduzir a ligação do plasmídio vazio, na reação, deve haver um excesso de moléculas de inserto! Esta razão pode ser de 2:1, 3:1...ou seja, duas ou três moléculas de inserto para cada uma de plasmídio. A melhor razão é determinada experimentalmente. No entanto, não adianta simplesmente colocar 50 ng de plasmídio e 100 ng de inserto, pois a quantidade em ng a ser adicionada para se atingir uma determinada razão I:V depende do tamanho dos fragmentos e existe uma fórmula para se calcular o quanto em ng se deve adicionar para se obter uma determinada razão molar, conhecendo-se o tamanho plasmídio e do inserto.

(continua....)

2 comentários:

Patrícia Ferreira disse...

Qual a formula para saber quantos ng se deve adicionar para se obter uma determinada razão molar, conhecendo-se o tamanho plasmídio e do inserto?

Juliana Americo disse...

Oi Patrícia,

Você pode ver a fórmula neste link:

http://www.promega.com/a/apps/biomath/index.html?calc=ratio&_ga=2.164314111.1375449329.1498479186-1544103668.1498479186